“Somos um acaso da natureza, uma peculiaridade da evolução, uma gloriosa casualidade”.
A frase resume toda a minha experiência no museu, que percorri de fio a pavio ao longo de quatro horas, sem conseguir tirar do pensamento a inquietante questão de sermos ou não um acaso da natureza.
Sentei-me na margem do rio e pus os pés de molho, um bálsamo depois das quatro horas de caminhada no museu. Sob o sol de fim de tarde, a questão sobre a casualidade da nossa existência foi-se desvanecendo à medida que a valsa de Johann Strauss II tingia de azul a água acinzentada do e me transportava para um salão de baile iluminado por lustres resplandecentes na Viena do século XIX, onde senhoras em vestidos esvoaçantes e cavalheiros em trajes impecáveis giravam ao som de— é este o título original, inspirado no fecho de um poema de Karl Isidor Beck: “às margens do Danúbio, o belo e azul Danúbio”.
A observar a corrente lenta, interroguei-me demoradamente sobre as histórias e segredos que o Danúbio transporta ao longo dos séculos. A dado momento, vindos não sei de onde, quatro cisnes deslizaram tranquilamente à minha frente como bailarinos num palco líquido e recordaram-me a importância de esqueceremos as dúvidas e interrogações durante algum tempo e simplesmente ser.
O Danúbio continuou a fluir no seu leito, indiferente à presença passageira dos observadores temporários do seu espetáculo eterno e às casualidades e peculiaridades que os trazem até às suas margens.Jornalista, palestrante e autor dos livros "O Sofrimento Pode Esperar" e "Quantas vidas temos?" Com uma assinatura PÚBLICO tem acesso ilimitado a todos os conteúdos e cancela quando quiser.